Ignorando todos os problemas ocasionados pela falta de planejamento e diálogo com os profissionais da educação, a Secretaria de Estado da Educação estabeleceu o dia 15 de fevereiro como o dia da "instalação da placa do IDEB nas escolas estaduais.
A Secretaria de Educação tenta transformar mecanismos externos de avaliação em peça de marketing, sem promover o diálogo e a reflexão sobre os dados que a avaliação aponta. Escolas com desempenho abaixo do desejado pelo Governo são expostas e responsabilizadas. Não há diálogo sobre as condições de trabalho, não há política preventiva que modifique o quadro de adoecimento do professor e a Secretaria insiste em ignorar a realidade da escola pública estadual.
A ideia de exposição e responsabilização do professor não é nova. Outros países a adotaram e já avaliaram os erros de um sistema que não significou mais qualidade à educação. Só a Secretaria de Educação de Minas Gerais insiste no erro. Educação é o espaço do debate, da reflexão, da construção coletiva: tudo o que não temos.
Acompanhe a entrevista da Diane Ravitch. Ela é pesquisadora de educação da Universidade de Nova York. Autora de vários livros sobre sistemas educacionais, foi secretária-adjunta de Educação e conselheira do secretário de Educação entre 1991 e 1993, durante o governo de George Bush. Foi indicada pelo ex-presidente Bill Clinton para o National Assessment Governing Board, órgão responsável pela aplicação dos testes educacionais americanos.
'Nota mais alta não é educação melhor'
Diane Ravitch, ex-secretária-adjunta de Educação dos EUA
02 de agosto de 2010 | 0h 00
Simone Iwasso - O Estado de S.Paulo
Uma das principais defensoras da reforma educacional americana -
baseada em metas, testes padronizados, responsabilização do professor pelo
desempenho do aluno e fechamento de escolas mal avaliadas - mudou de ideia.
Após 20 anos defendendo um modelo que serviu de inspiração para outros países,
entre eles o Brasil, Diane Ravitch diz que, em vez de melhorar a educação, o
sistema em vigor nos Estados Unidos está formando apenas alunos treinados para
fazer uma avaliação.
Secretária-adjunta de Educação e conselheira do secretário de
Educação na administração de George Bush, Diane foi indicada pelo ex-presidente
Bill Clinton para assumir o National Assessment Governing Board, instituto
responsável pelos testes federais. Ajudou a implementar os programas No Child Left
Behind e Accountability, que tinham como proposta usar práticas corporativas,
baseadas em medição e mérito, para melhorar a educação.
Suas revisão de conceitos foi apresentada no livro The Death and
Life of the Great American School System (a morte e a vida do grande sistema
escolar americano), lançado no mês passado nos EUA. O livro, sem previsão de
edição no Brasil, tem provocado intensos debates entre especialistas e gestores
americanos. Leia entrevista concedida por Diane ao Estado.
Por que a senhora mudou de ideia sobre a reforma educacional
americana?
Eu apoiei as avaliações, o sistema de accountability
(responsabilização de professores e gestores pelo desempenho dos estudantes) e
o programa de escolha por muitos anos, mas as evidências acumuladas nesse
período sobre os efeitos de todas essas políticas me fizeram repensar. Não
podia mais continuar apoiando essas abordagens. O ensino não melhorou e
identificamos apenas muitas fraudes no processo.
Em sua opinião, o que deu errado com os programas No Child Left
Behind e Accountability?
O No Child Left Behind não funcionou por muitos motivos. Primeiro,
porque ele estabeleceu um objetivo utópico de ter 100% dos estudantes com
proficiência até 2014. Qualquer professor poderia dizer que isso não
aconteceria - e não aconteceu. Segundo, os Estados acabaram diminuindo suas
exigências e rebaixando seus padrões para tentar atingir esse objetivo utópico.
O terceiro ponto é que escolas estão sendo fechadas porque não atingiram a
meta. Então, a legislação estava errada, porque apostou numa estratégia de
avaliações e responsabilização, que levou a alguns tipos de trapaças, manobras
para driblar o sistema e outros tipos de esforços duvidosos para alcançar um
objetivo que jamais seria atingido. Isso também levou a uma redução do
currículo, associado a recompensas e punições em avaliações de habilidades
básicas em leitura e matemática. No fim, essa mistura resultou numa lei ruim,
porque pune escolas, diretores e professores que não atingem as pontuações
mínimas.
Qual é o papel das avaliações na educação? Em que elas contribuem?
Quais são as limitações?
Avaliações padronizadas dão uma fotografia instantânea do
desempenho. Elas são úteis como informação, mas não devem ser usadas para
recompensas e punições, porque, quando as metas são altas, educadores vão
encontrar um jeito de aumentar artificialmente as pontuações. Muitos vão passar
horas preparando seus alunos para responderem a esses testes, e os alunos não
vão aprender os conteúdos exigidos nas disciplinas, eles vão apenas aprender a
fazer essas avaliações. Testes devem ser usados com sabedoria, apenas para dar
um retrato da educação, para dar uma informação. Qualquer medição fica
corrompida quando se envolve outras coisas num teste.
Na sua avaliação, professores também devem ser avaliados?
Professores devem ser testados quando ingressam na carreira, para
o gestor saber se ele tem as habilidades e os conhecimentos necessários para
ensinar o que deverá ensinar. Eles também devem ser periodicamente avaliados
por seus supervisores para garantir que estão fazendo seu trabalho.
E o que ajudaria a melhorar a qualidade dos professores?
Isso depende do tipo de professor. Escolas precisam de
administradores experientes, que sejam professores também, mais qualificados.
Esses profissionais devem ajudar professores com mais dificuldades.
Com base nos resultados da política educacional americana, o que
realmente ajuda a melhorar a educação?
As melhores escolas têm alunos que nasceram em famílias que apoiam
e estimulam a educação. Isso já ajuda muito a escola e o estudante. Toda escola
precisa de um currículo muito sólido, bastante definido, em todas as
disciplinas ensinadas, leitura, matemática, ciências, história, artes. Sem essa
ênfase em um currículo básico e bem estruturado, todo o resto vai se resumir a
desenvolver habilidades para realizar testes. Qualquer ênfase exagerada em
processos de responsabilização é danosa para a educação. Isso leva apenas a um
esforço grande em ensinar a responder testes, a diminuir as exigências e outras
maneiras de melhorar a nota dos estudantes sem, necessariamente, melhorar a
educação.
O que se pode aprender da reforma educacional americana?
A reforma americana continua na direção errada. A administração do
presidente Obama continua aceitando a abordagem punitiva que começamos no
governo Bush. Privatizações de escolas afetam negativamente o sistema público
de ensino, com poucos avanços de maneira geral. E a responsabilização dos
professores está sendo usada de maneira a destruí-los.
Quais são os conceitos que devem ser mantidos e quais devem ser
revistos?
A lição mais importante que podemos tirar do que foi feito nos
Estados Unidos é que o foco deve ser sempre em melhorar a educação e não
simplesmente aumentar as pontuações nas provas de avaliação. Ficou claro para
nós que elas não são necessariamente a mesma coisa. Precisamos de jovens que
estudaram história, ciência, geografia, matemática, leitura, mas o que estamos
formando é uma geração que aprendeu a responder testes de múltipla escolha.
Para ter uma boa educação, precisamos saber o que é uma boa educação. E é muito
mais que saber fazer uma prova. Precisamos nos preocupar com as necessidades
dos estudantes, para que eles aproveitem a educação.